VII ENCONTRO VIRTUAL DO CONPEDI
DIREITO PENAL, PROCESSO PENAL E CONSTITUIÇÃO I

APRESENTAÇÃO

O presente trabalho associa-se ao Grupo de Trabalho intitulado Direito Penal, Processo Penal e Constituição I do VII Evento Virtual do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação e conta com 20 artigos. Dentre as categoriais conceituais constata-se: Constituição Federal, Democracia, Direito Penal, Estado, Justiça Penal, Lei Maria da Penha, Processo Penal, Sociedade da Informação e Sociedade de Risco.

O primeiro texto nomina-se A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E OS ASPECTOS PENAIS E DO PROCESSO PENAL: ALCANCES E LIMITES PARA O LEGISLADOR ORDINÁRIO EM MATÉRIA PENAL, sob autoria de Luiz Gustavo de Oliveira Santos Aoki e Antonio Carlos da Ponte e se apresenta com o objetivo de examinar a evolução histórica dos aspectos materiais do direito penal e processual penal à luz dos preceitos constitucionais, delineando os limites e extensões para a atuação do legislador ordinário. Ao adotar uma abordagem indutiva-histórica, o estudo analisa uma gama de fontes, incluindo documentos históricos, contribuições doutrinárias, jurisprudência e legislação pertinente. Conclui-se que o legislador não deve apenas criar, mas identificar e fortalecer os interesses relevantes, estabelecendo, assim, um critério de restrição ao ímpeto punitivo estatal. Tal compreensão visa não apenas a limitar a intervenção penal às necessidades reais da sociedade, mas também a salvaguardar os valores constitucionais, direitos fundamentais e os direitos individuais. Dessa forma, o artigo oferece uma análise crítica sobre o papel do legislador na formulação e aplicação do direito penal, contribuindo para o debate sobre a necessidade de equilibrar o poder estatal com os princípios democráticos, efetivação dos direitos e as garantias fundamentais estabelecidas pela Constituição Federal.

O segundo artigo, redigido por Allan Thiago Barbosa Arakaki e Maria De Fatima Ribeiro, discorre sobre A FUNÇÃO SOCIAL DA POLÍCIA MILITAR E UMA NOVA FORMA DE ATUAÇÃO NA SEGURANÇA PÚBLICA e discute o papel das forças das polícias militares e a imprescindibilidade de um novo formato legitimador às suas funções institucionais, à luz da teoria do agir comunicativo. Nesse ponto, ultrapassa-se o viés apenas dogmático para se compreender o desenvolvimento de um novo formato de policiamento baseado no agir comunicativo. O método empregado é o dedutivo por atender às pretensões desta pesquisa e se cuida de uma pesquisa bibliográfica e documental. Parte-se inicialmente do papel dogmático das forças de segurança e os desafios diante da alta taxa de letalidade. Após, ingressa-se na função solidária das forças de segurança, buscando diferenciá-la da função social e o que ela albergaria. Ao fim, enfoca-se como o agir comunicativo poderia auxiliar na formulação de um novo formato de policiamento e o que isso implica, denotando um novo formato de policiamento. Conclui-se que a compreensão da função solidária das forças de segurança demanda a construção de elos comunicativos com a população atendida, por intermédio de desenvolvimento de parcerias, ultrapassando o papel meramente dogmático. O referencial teórico utilizado é a teoria do agir comunicativo, desenvolvida por Habermmas, e compreensões do modelo de policiamento firmados por Zaffaroni.

Na sequência sob redação dos autores Allan Thiago Barbosa Arakaki , Emerson Santiago Pereira , Marilda Tregues De Souza Sabbatine com o título A NECESSIDADE DE MUDANÇA DE PARADIGMAS NAS ALTERAÇÕES DA LEI MARIA DA PENHA. O artigo analisa o aumento do número das infrações doméstico-familiar contra a mulher à luz da Lei 11.340/06. O objetivo secundário, por sua vez, relaciona-se a examinar se o recrudescimento unilateral da legislação penal possibilita ou não um resultado mais efetivo de segurança coletiva nessa dinâmica. A pesquisa é de natureza bibliográfica, documental e jurisprudencial, sendo empregado o método dedutivo. Parte-se da premissa geral, discorrendo sobre o panorama da Lei 11.340/06 e sua importância. Após, adentra às diversas mudanças da lei e o aumento dos crimes albergados por ela, fazendo um paralelo com a política criminal do Broken Window e buscando identificar se funciona ou não a política criminal mais rígida em tais contextos. Debruça-se, posteriormente, a delinear propostas que poderiam auxiliar a adotar uma tônica mais producente no combate à violência de gênero. Ao fim, conclui-se que um dos motivos centrais de não haver diminuição nos crimes analisados é que o mero recrudescimento de política pública criminal, divorciada de outros elementos ressocializantes, não promove a pacificação social. Ao contrário disso, cuida-se de uma manobra do próprio Direito Penal Simbólico, alçando indivíduos como inimigo e, em geral, possibilitando uma resposta imediatista que não auxilia no enfrentamento da questão. O referencial teórico empregado é lastreado na teoria do agir comunicativo, utilizando ainda um enfoque positivista e dogmático.

O próximo artigo com o título A PERSPECTIVA ÉTICA DE RESPONSABILIDADE COMUNITÁRIA DESDE A RESOLUÇÃO N. 487/2023, DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA e da autora Camila Maués dos Santos Flausino aporta-se em referenciais pós-estruturalistas, como Rosine Kelz, Didier Fassin, Roberto Esposito e Judith Butler e busca problematizar, no campo afetivo político-filosófico, as ações e intervenções oficiais de governos humanitários voltadas à proteção de pessoas com transtorno mental em conflito com a lei penal. Pautada como discurso oficial, e como o encontro do “outro” repercute em dinâmicas afetivas, psíquicas e políticas voltadas a alteridades irredutíveis. Trata-se de pesquisa com abordagem dedutiva e, quanto ao procedimento, bibliográfica. Ao final, a partir da Resolução n. 487/2023, do CNJ, útil no estudo como protótipo analítico, permitiu-se refletir sobre possíveis afetos políticos que fomentam agendas de governos humanitários nesse campo e como eles se engatam em aproximação ao projeto de reformulação da responsabilidade ética de dever mútuo de desenvolvimento da máxima potencialidade humana e de rompimento de fronteiras que normativamente são estabelecidas como verdades jurídico-médicas.

O quinto artigo tem como autor Guilherme Manoel de Lima Viana e o título é A PROVA ILÍCITA E A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO. O trabalho explora a interseção entre a prova ilícita e a sociedade da informação no cenário jurídico atual. O foco central reside na emergência e prevalência crescente de evidências digitais, impulsionadas pelo avanço tecnológico e pela expansão ininterrupta da sociedade digital. Utilizando uma metodologia de revisão de literatura, a pesquisa aprofunda a análise jurídica, considerando casos específicos e tendências legais relevantes dentro do contexto da sociedade da informação. Os resultados apontam para a necessidade urgente de abordagens jurídicas inovadoras capazes de enfrentar as complexidades decorrentes da prova ilícita na sociedade da informação. Destaca-se a importância de equilibrar a busca pela verdade processual com a proteção rigorosa dos direitos fundamentais, sugerindo a implementação de diretrizes e medidas concretas. O artigo conclui ressaltando a crucial importância de adaptar as estruturas legais existentes para enfrentar as mudanças sociais e tecnológicas, proporcionando um arcabouço flexível que possa eficazmente lidar com as nuances da prova ilícita na sociedade da informação. Nesse contexto, propõe-se não apenas uma resposta às implicações jurídicas, mas também um chamado à reflexão sobre como preservar a integridade do sistema judicial diante dos desafios complexos decorrentes da evolução tecnológica. O objetivo final é estabelecer um sistema judicial resiliente, justo e adaptável, capaz de enfrentar os dilemas contemporâneos de maneira eficaz.

A SOCIEDADE DE RISCO E O DIREITO PENAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO dos autores Ana Cristina Santos Chaves , Marcos Paulo Andrade Bianchini Eduardo Augusto Gonçalves Dahas contempla o texto seis. Este artigo examina a relação entre a teoria da Sociedade de Risco de Ulrich Beck em sua obra "Sociedade de risco: Rumo a outra modernidade", analisando os impactos dos riscos globais decorrentes dos constantes avanços tecnológicos advindos após a revolução industrial que gera uma sociedade do medo e insegura e cada vez mais reflexiva ante os riscos provocados na contemporaneidade. Também analisou como os riscos modernos que desafiam as estruturas tradicionais existentes no Estado Democrático de Direito e no direito penal. Discute a mudança de paradigma na sociedade que precisa lidar com riscos globais normalmente não intencional, mas com potencial lesivo impactante em todo o mundo que transcende as fronteiras territoriais, econômicas, clássicas e científicas. Foi analisado o desafio do Estado Democrático de Direito a se adaptar a uma realidade complexa e interconectada. Foi analisado a sociedade de risco descrita por Ulrich Beck frente as teorias funcionalistas sistêmicas. Utilizou-se o método-dedutivo, e como fontes primárias, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988) e os autores Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias, José Afonso da Silva, na definição de Estado Democrático de Direito, a teoria funcionalista teleológica na visão de Claus Roxin e funcionalista sistêmica na visão de Günther Jakob, fazendo uma correlação com a sociedade de risco de Ulrich Beck. Conclui-se que a sociedade de risco descrita por Beck, vê nos avanços tecnológicos e a globalização a criação de novos riscos e incertezas que atravessam fronteiras nacionais e desafia o direito penal.

O artigo sétimo, intitulado A SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA COMO UM INDEVIDO ESTADO DE COISAS DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: BREVES CONJECTURAS SOBRE OS OBSTÁCULOS PARA SUA SUPERAÇÃO NO BRASIL, com escrita de Barbara Labiapari Pinto e Fernando Laércio Alves da Silva, apresenta resultado de investigação conduzida sobre a situação do sistema prisional brasileiro e busca lançar luzes sobre o problema da superlotação carcerária. Problema tão antigo e endêmico no Brasil que sequer pode ser considerado como uma situação de crise, mas, de fato, um estado de coisas persistente e indevido. Exatamente por se tratar de tema tantas vezes discutido, na presente pesquisa se propôs analisa-lo a partir de novas lentes, conjugando a já comum leitura da insuficiência de vagas com questões que impactam, ou pelo menos deveriam impactar no sistema, como as medidas alternativas à prisão, de um lado, e a mudança de orientação do STF sobre a possibilidade da decretação da prisão após decisão condenatória não transitada em julgado, por outro. Metodologicamente, a investigação, de abordagem quali-quanti, desenvolveu-se por meio da coleta de dados documentais sobre o sistema prisional do INFOPEN, CNMP e, CNJ (2008-2023) e pela coleta e análise de julgados, notadamente das decisões do STF acerca da temática da execução penal após condenação em segunda instância, e pela coleta e análise bibliográfica, realizada a partir do Portal de Periódicos da CAPES e do Banco de Dissertações e teses da CAPES. Caminho trilhado para tentar identificar o grau de eficiência do modelo de penas alternativas à prisão estabelecido pela Lei n. 9.714/98 e o impacto da insegurança jurídica e, principalmente, da inadequada compreensão da possibilidade de execução provisória da pena privativa de liberdade no sistema prisional brasileiro.

O ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL: EFEITOS DA CONFISSÃO EM CASO DE NÃO CUMPRIMENTO DO ACORDO foi o tema apresentado por Victor Dessunti Oliveira , Felipe Ryuji Coimbra Miyamoto e Andrezza Damasceno Machado. O artigo é dedicado a compreender como a confissão do réu afeta o andamento processual quando um acordo de não persecução penal não é cumprido. Os autores demonstram que o ANPP pode oferecer uma alternativa flexível ao processo tradicional, permitindo que as autoridades ajam de forma adaptativa em diferentes situações. Isso pode ser particularmente útil em casos onde a culpabilidade é clara e as partes envolvidas concordam com os termos do acordo. Em relação a utilização da confissão como prova em eventual ação judicial, decorrente do descumprimento do acordo, os autores defendem a sua impossibilidade, vez que a confissão é feita antes da denúncia, ou seja, antes mesmo de iniciar a ação judicial. Assim sendo, a confissão em sede inquisitiva, como é o caso do ANPP, não pode ser utilizada como prova na ação judicial, devendo o processo seguir seu curso normal, conforme consta no Código de Processo Penal, por respeito ao devido processo legal, bem como a todas as garantias previstas na Constituição Federal.

Os autores Kennedy Da Nobrega Martins e Alexandre Manuel Lopes Rodrigues apresentaram o artigo intitulado AGENDAMENTO ELETRÔNICO PARA ATENDIMENTO DO CLIENTE PRESO: ANÁLISE DO IMPACTO DA PORTARIA Nº 164/2020 – SEAP/PA NA PRÁTICA DA ADVOCACIA CRIMINAL. A Portaria nº 164/2020 – SEAP/PA regula o acesso dos advogados às unidades prisionais no Pará, estabelecendo horários específicos para atendimentos e introduzindo um sistema de agendamento eletrônico para atendimento e entrevista pessoal e reservada com clientes. O estudo analisa como essa normativa afeta a prática da advocacia criminal, a relação advogado-cliente, especialmente em um contexto de justiça penal, onde o acesso rápido e eficiente à representação legal é crucial. A conclusão aponta que o equilíbrio entre a segurança prisional e os direitos dos detidos e seus defensores é um aspecto imprescindível a ser considerado na implementação de qualquer nova tecnologia ou política, devendo-se buscar, por meio do diálogo, soluções que respeitem as garantias constitucionais e profissionais dos advogados, ao mesmo tempo em que se aproveitam os benefícios que as inovações tecnológicas podem oferecer para a eficiência e eficácia dos processos judiciários e prisionais.

Giovanna Aguiar Silva e Fernando Laércio Alves da Silva jogam luz a um problema percebido com muita perspicácia: a liberdade decisória da vítima nos delitos sexuais. O título do artigo é COM SENTIMENTO: DESVELANDO O IMPACTO DO PATRIARCADO E DO PATRIMONIALISMO NA IDENTIFICAÇÃO DA VONTADE-CONSENTIMENTO DA VÍTIMA MULHER ENQUANTO ELEMENTO DE CARACTERIZAÇÃO/DESCARACTERIZAÇÃO DOS CRIMES SEXUAIS. Passados quase um quarto de século da edição da Lei n. 12.015/2009, os autores realizaram um balanço dos avanços concretos na proteção à dignidade e à liberdade sexual das mulheres. O trabalho investigou a jurisprudência do TJMG quanto à adequada compreensão dos aspectos da liberdade decisória da mulher (consentimento) quanto ao exercício de sua sexualidade e seu impacto na caracterização ou não de crimes sexuais. O objetivo geral foi identificar se a análise judicial ainda se encontra enviesada por aspectos de uma cultura patriarcal. Para tanto, conduziu-se uma pesquisa qualitativa, metodologicamente estruturada, adotando como corte temporal o intervalo entre janeiro de 2010 a dezembro de 2020. As conclusões desta investigação, confirmam que a perspectiva civilista do conceito de consentimento não se mostra suficiente para a compreensão da complexidade do consentir e do querer, relacionados à realização da liberdade sexual pela mulher e deixam claro que no plano da atuação judicial, existem indícios de que a visão dos julgadores está atrelada, muitas vezes, não apenas à míope compreensão do direito civil, mas, de fato, vinculada a um ideal de mundo, no mínimo, novecentista.

Outro assunto muito contemporâneo foi apresentado por Euller Marques Silva e Yuri Anderson Pereira Jurubeba com o artigo FILHO ADOTIVO NO HOMICÍDIO FUNCIONAL: UMA ANÁLISE CONSTITUCIONAL DA QUALIFICADORA. Este artigo examinou a inclusão dos filhos adotivos como sujeitos passivos no contexto do homicídio funcional, fazendo um paralelo entre o dispositivo legal que incluiu a qualificadora e o reconhecimento constitucional da igualdade entre filhos adotivos e biológicos. Os autores explicam que a problemática abordada consiste no fato de que o Legislador, no ano de 2015, ao instituir uma nova qualificadora para os homicídios cometidos contra agentes de segurança pública e seus parentes próximos, utilizou-se da expressão “parentes consanguíneos”, excluindo, assim, os filhos adotivos dessa proteção, gerando uma violação ao princípio constitucional de isonomia entre as origens de filiação.

A INAPLICABILIDADE DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL AO CRIME DE RACISMO foi o tema desenvolvido por Felipe Ryuji Coimbra Miyamoto, Andrezza Damasceno Machado e Victor Dessunti Oliveira. Segundo os autores, a Lei nº 13.964 de 2019 inovou o ordenamento jurídico com a inserção do acordo de não persecução penal (ANPP), inspirado no plea bargaining, que possibilita a negociação entre o Ministério Público e o acusado. O artigo questiona se o ANPP pode ser aplicado ao crime de racismo. O artigo debate a inconstitucionalidade da aplicação do acordo de não persecução penal ao crime de racismo, considerando que a Constituição estabelece o combate ao racismo como um objetivo fundamental da República e como um dos princípios orientadores do Brasil em suas relações internacionais.

Um artigo que chamou muito a atenção foi o apresentado por João Victor Tayah Lima , Nilzomar Barbosa Filho e Alysson de Almeida Lima com o título de MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NA POLÍCIA CIVIL: REFLEXÕES ENTRE OS PODERES E OS DEVERES JURÍDICOS DO DELEGADO DE POLÍCIA. Os autores promoveram um estudo acerca das atribuições constitucionais e legais do delegado de polícia no emprego da mediação de conflitos.

Os autores sustentam que as delegacias de polícia são órgãos públicos que funcionam como receptores constantes dos mais variados conflitos sociais. Assim, atendendo a paradigmas principiológicos constitucionais, em especial à legalidade e à eficiência, é essencial que as autoridades policiais civis, em uma perspectiva de segurança pública cidadã e de preservação dos direitos humanos, abrace sua missão transformadora dos conflitos, priorizando os métodos não-violentos em sua resolução. O artigo, pois, apresenta uma mudança paradigmática, que, segundo seus autores, não apenas possível, mas essencial, e, somente assim, as delegacias de polícia abandonarão o estigma de espaços sombrios destinados exclusivamente à punição para assumirem uma nova roupagem acolhedora, onde as pessoas comparecem para verem efetivados os seus direitos fundamentais.

Para isto, foi utilizado o método dedutivo, que partiu de premissas jurídicas universais aplicáveis ao escopo jurídico para se chegar ao particular, no caso, a função do delegado de polícia. Empreendeu-se uma incursão documental e bibliográfica, com uso da legislação nacional, de solicitações de acesso à informação dirigidas a órgãos públicos e de obras doutrinárias que pudessem se relacionar com o tema proposto, tornando possível desenvolver uma pesquisa explicativa. No que tange à abordagem, a pesquisa foi qualitativa, embora dados quantitativos sobre ocorrências criminais da Polícia Civil do Estado do Amazonas tenham servido de apoio às hipóteses levantadas. O

s resultados da pesquisa demonstram que o uso da mediação policial encontra amparo jurídico amplo, tendo em vista que atende a princípios constitucionais norteadores da função administrativa e a diretrizes e procedimentos já previstos na legislação infraconstitucional. Ademais, trata-se de um instituto com ampla aplicação no quotidiano policial, tendo em vista o alto número de ocorrências criminais que só se procedem mediante queixa ou representação, possibilitando o uso do mencionado método autocompositivo de conflitos. A conclusão evidencia que a mediação é uma prática restaurativa desejável nos criminais de ação privada e ação penal pública condicionada à representação, pois tem o poder de transformar positivamente o conflito, atendendo às necessidades, tanto da sociedade, quanto da máquina administrativa.

O artigo intitulado “MIRANDA V. ARIZONA: O PARADIGMA CONSTITUCIONAL NORTE AMERICANO QUE SOLIDIFICOU O DIREITO AO SILÊNCIO ULTRAPASSANDO AS FRONTEIRAS NACIONAIS”, foi escrito por Fernanda Matos Fernandes de Oliveira Jurubeba e Yuri Anderson Pereira Jurubeba. O texto externa que, ao longo dos séculos, o pêndulo das confissões oscilou da permissão da coerção extrema, ou mesmo da tortura, para um modelo mais racionalista. Em 1966, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu que a Quinta Emenda da Constituição restringe os promotores de utilizar as declarações de uma pessoa feitas em resposta ao interrogatório sob custódia policial como provas no seu julgamento, a menos que possam demonstrar três importantes condições: que a pessoa foi informada sobre seu direito de consultar um advogado antes e durante o interrogatório; do seu direito contra a autoincriminação; e que o arguido não só compreendeu esses direitos, mas também voluntariamente os dispensou. O estudo tem como objetivo examinar o famoso precedente norte-americano, destrinchando seu histórico, o voto dos membros da Suprema Corte e, o mais importante, as questões relativas aos direitos do acusado no processo penal, que ultrapassam o sistema jurídico norte americano e são identificadas como princípio básico de todo Estado Democrático de Direito. Para tanto, os autores se valeram da pesquisa bibliográfica e documental, por meio da abordagem qualitativa dos resultados.

O texto seguinte, intitulado “NORMATIZAÇÃO DO DOLO E PESSOA JURÍDICA CRIMINOSA”, dos autores Antônio Carlos da Ponte e Eduardo Luiz Michelan Campana, retoma a discussão acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica, diante dos crescentes riscos e lesões a bem jurídicos causados por empresas que apresentam complexas estruturas organizacionais. Após a análise das clássicas objeções à punibilidade de um ente coletivo, parte-se para o estudo do dolo sob os prismas das correntes de pensamento causalista, finalista e funcionalista, perquirindo-se acerca da normatização do dolo como possível solução para a imputação de fatos delituosos a pessoas jurídicas, ainda que não se consiga responsabilizar as pessoas físicas que as compõem. Em seguida, são expostas as teorias normativas do dolo sustentadas pelos expoentes do funcionalismo mínimo, moderado e radical, de corte volitivo e cognitivo, e a viabilidade de sua aplicação para a pessoa coletiva. Analisa-se, por fim, o atual entendimento jurisprudencial nos tribunais superiores que afasta, ainda que excepcionalmente, o sistema de dupla imputação adotado pela Lei 9.605/1998, propondo-se uma possível solução com fundamento na discussão acerca da normatização do dolo.

No texto que tem por título “O papel da teoria dos jogos na investigação criminal e sua conexão com o princípio do devido processo legal”, Kennedy Da Nobrega Martins e Alexandre Manuel Lopes Rodrigues discorrem que o entrelaçamento da teoria dos jogos com a investigação criminal oferece uma perspectiva inovadora sobre a dinâmica processual e sua interação com o princípio do devido processo legal. Esta abordagem, ao explorar a estratégia e a tomada de decisões dentro do sistema penal, ilumina aspectos cruciais que influenciam a condução das investigações e o desenvolvimento processual penal. Diante disso, o objetivo do artigo é examinar a interseção entre a teoria dos jogos e a investigação criminal, avaliando como essa interação molda a aplicação do princípio do devido processo legal dentro das regras da Carta Magna. A metodologia adotada na pesquisa foi a revisão bibliográfica, envolvendo uma análise de literatura especializada, abrangendo textos jurídicos, estudos sobre a teoria dos jogos, especialmente do autor Alexandre Morais da Rosa, e trabalhos acadêmicos relacionados. Nesse sentido, a teoria dos jogos se apresenta como uma ferramenta para auxiliar o tomador de decisão na busca da escolha mais eficiente. Quando aplicada ao inquérito policial, os envolvidos (como o Delegado, Ministério Público e defesa) atuam estrategicamente para atingir seus objetivos. Dessa forma, o inquérito é vital, pois as decisões tomadas afetam diretamente o desfecho do caso, realçando a necessidade de uma abordagem lógica e cuidadosa em todas as etapas, respeitando o devido processo legal e as regras do jogo constitucional.

O texto seguinte, de autoria de Marcos Paulo Andrade Bianchini, Alexandre Marques de Miranda e Carlos José Seabra De Melo, tem por título “OS DESAFIOS DO DIREITO PENAL NA SOCIEDADE DE RISCO”. Na pesquisa empreendida, os autores analisam o funcionalismo teleológico e o funcionalismo sistêmico e investigam se houve a superação do paradigma funcionalista na sociedade contemporânea frente à sociedade de risco característica da modernidade pós-industrial. Foram analisados o diálogo entre o funcionalismo teleológico e o funcionalismo sistêmico, interpretada a sociedade de risco descrita por Ulrich Beck e examinado o expansionismo penal desenvolvido por Silva Sánchez. Utilizou-se o método hipotético-dedutivo, e como fontes primárias a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988), que serve como referência legal fundamental, bem como a teoria do funcionalismo teleológico, representada por Claus Roxin, e a teoria do funcionalismo sistêmico, elaborada por Günther Jakobs. Foram investigadas as teorias da sociedade de risco de Ulrich Beck e o conceito de expansionismo penal desenvolvido por Silva Sanchez. O texto conclui que o expansionismo e a inflação legislativa em relação ao direito penal fazem perecer de efetividade a proteção seja de bens jurídicos ou do próprio sistema de normas importantes para a vida em sociedade.

Em “PROMESSA NÃO CUMPRIDA: A FALÁCIA IDEOLÓGICA DA PENA DE PRISÃO COMO RESSOCIALIZADORA DO CIDADÃO”, os autores Luiz Fernando Kazmierczak e Vinicius Hiudy Okada discorrem que a gestão cotidiana dos serviços penais enfrenta perda de controle interno, violando direitos, comprometimento da individualização penal, déficit de gestão e falta de transparência, conjunto classificado como “Estado de coisa inconstitucional” pelo STF. O Código Penal prevê a reincidência em seu art. 63, verificando-se quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que o tenha condenado por crime anterior. Criminologia clínica é uma atividade complexa de conhecimentos interdisciplinares predominantemente científicos, voltada à prática profissional. O seu modelo de inclusão social implica um rompimento com os pressupostos lógicos do sistema punitivo – uma inversão hierárquica e subordinativa –, não sendo considerado uma criminologia crítica e nem tem compromissos com os postulados do pensamento crítico. A teoria do labelling approach significa um abandono do paradigma etiológico-determinista e a substituição de um modelo estático e monolítico de análise social por uma perspectiva dinâmica e contínua de corte democrático. A teoria foi bem recepcionada pela doutrina penal brasileira, sendo introduzida pelas Leis nº 7.209/84 e nº 7.210/84, influenciando inclusive a Constituição Federal de 1988. Conclui-se, através deste trabalho, que a pena de prisão como ressocializadora do cidadão não passa de uma falácia ideológica, visto que o condenado não está sendo preparado para reingressar na sociedade, mas sendo “desculturado”.

No trabalho intitulado “UMA NECESSÁRIA INTERVENÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA COMO CUSTOS VULNERABILIS EM DEFESA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS”, a autora Wilza Carla Folchini Barreiros discorre, a partir de pesquisa bibliográfica e da análise factual do comportamento dos três Poderes, que há uma crescente repressão aos movimentos sociais. O objetivo do artigo é, por meio da investigação de normas e princípios, buscar mecanismos que auxiliam na mudança de posição que os integrantes de movimentos sociais vêm ocupando no âmbito das ações penais, em geral, previamente taxadas como agentes promotores da desordem e da ilegalidade. O tema foi delimitado especificamente a repressão criminal dos ativistas dos movimentos de luta pelo direito à moradia e o acesso à terra, bem como meios de provocar mudanças perante o Poder Judiciário. Para tanto, traz as falhas na imputação do crime de esbulho possessório, em que se ignora elementos inerentes ao tipo, como a verificação da posse a partir do direito à moradia e da função social da propriedade. Nessa linha, e tendo como um dos fundamentos a teoria garantista de Ferrajoli, aponta-se como um dos mecanismos auxiliares a redução de desigualdades no processo penal a atuação da Defensoria Pública, na qualidade de custos vulnerabilis, em todos os processos envolvendo criminalização de integrantes dos movimentos sociais. A intervenção como custos vulnerabilis visa reequilibrar a relação processual penal, bem como atuar como importante ator na formação de precedentes que possam interessar os grupos de vulneráveis que representa.

Por fim, o trabalho que tem por título “VIDAS DESVASTADAS: DESASTRES AMBIENTAIS, DESLOCAMENTO FORÇADO E A PERSPECTIVA DE CRIMES CONTRA A HUMANIDADE”, dos autores Débora Guimarães Cesarino, Emanuelle de Castro Carvalho Guimarães e Luiz Gustavo Gonçalves Ribeiro, apresenta reflexões sobre a possibilidade do deslocamento forçado de pessoas causado por desastres ambientais oriundos de atividades empresariais serem classificados como crimes contra a humanidade. Por conseguinte, fez-se necessário estudar como ocorrem esses deslocamentos e suas consequências às populações atingidas, correlacionar essa conduta com os crimes contra a humanidade previstos art. 7, 1, d, do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, bem como analisar se esse enquadramento pode sujeitar as empresas violadoras às sanções penais internacionais. A metodologia utilizada foi a jurídico-teórica e o procedimento dedutivo, juntamente com a ampla pesquisa bibliográfica e documental. Considerando que a proteção do meio ambiente deve ser uma preocupação comum de toda a humanidade, conclui-se, por fim, que a criminalização expressa dessas ações causadas por empresas, com consequente julgamento pelo Tribunal Penal Internacional, traria uma resposta mais eficiente às vítimas, além de auxiliar na jornada de todos rumo a um futuro mais seguro e ecologicamente consciente.

Como o leitor pode observar, tratam-se de temas atuais e ecléticos, e que, por certo, contribuirão para reflexões críticas acerca do atual estágio do direito e do processo penal.

Excelente leitura.

Inverno de 2024.

Organizadores

Bartira Macedo Miranda/UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIAS

Luiz Gustavo Gonçalves Ribeiro/ESCOLA SUPERIOR DOM HELDER CÂMARA

Thais Janaina Wenczenovicz/UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL e UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA

ISBN:978-65-5648-992-6

Trabalhos publicados neste livro: