XXVI CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI SÃO LUÍS – MA
CRIMINOLOGIAS E POLÍTICA CRIMINAL II

O Grupo de Trabalho “Criminologia e Política Criminal II” realizado no XXVI Congresso Nacional do CONPEDI, na cidade de São Luís, na Universidade Ceuma, dentre os seus 14 trabalhos apresentados, discutiu as mais diversas problemáticas e densidades que permeiam o tema.

O primeiro trabalho, intitulado “O estado penal-psiquiátrico e a negação do ser humano (presumidamente) perigoso”, de autoria da professora Thayara Castelo Branco, tratou dos contornos do direito penal de “tratamento” com base no discurso médico-psiquiátrico, buscando analisar as consequências da reação (penal) ao sujeito “perigoso” e potencialmente criminoso, bem como a herança dessa periculosidade no Sistema de Justiça Criminal brasileiro. Dessa forma, problematizou o Estado penal-psiquiátrico que passou a conectar a noção de “doença” e de “perigo” como justificativa de negação e aniquilamento do ser humano.

O segundo trabalho, “São Luís, de Ilha do Amor à Ilha do Terror: a “conquista” do 21º lugar dentre as cidades mais violentas do mundo”, foi de autoria do professor Mauricio José Fraga Costa. O autor aponta que após a ONG Conselho Cidadão pela Seguridade Social Pública e Justiça Penal do México divulgar o ranking das 50 cidades mais violentas do mundo em 25 de janeiro de 2016, São Luís foi apontada como a 21ª. O trabalho pretendeu identificar as causas desta situação que teria iniciado com o incremento do tráfico de drogas e se consolidou com a constituição de facções criminosas em relações com outros grupos organizados de outras partes do país. O autor propôs que as políticas públicas não sejam apenas reativas ao crime, apontando que o programa de georreferenciamento, segundo dados de 2016, já aponta para uma melhoria da situação de violência.

O terceiro trabalho, de autoria de Joao Victor Duarte Moreira e Lucas Silva Machado, chamado “Da legitimidade do Superior Tribunal de Justiça para resolver a questão da política criminal referente ao art. 273 do Código Penal”, aborda o art. 273 que tipifica a conduta de “falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais” e sofreu alterações legislativa que aumentaram a pena e indicaram-no como crime hediondo. O trabalho discute a legitimidade do STJ que declarou a inconstitucionalidade apenas do preceito secundário do tipo, bem como, diante desta situação, qual seria a pena aplicável para este tipo penal.

O quarto trabalho das autoras Daiane Ayumi Kassada e Érika Mendes de Carvalho, tratou da “Responsabilidade das pessoas jurídicas em infrações ambientais em face do princípio do “ne bis in idem”: uma abordagem político-criminal”. As autoras discutiram a aplicação do princípio do “ne bis in idem” no âmbito dos crimes ambientais, uma vez que há previsão constitucional da responsabilidade das pessoas jurídicas no âmbito penal e administrativo. Naturalmente não se discute que uma pessoa (seja física ou jurídica) possa ser punida duas vezes na seara penal ou duas vezes na seara administrativa pelo mesmo fato, o que não se discute é o aspecto transversal, ou seja, se existe um impedimento, à luz do “ne bis in idem” de que uma pessoa sofra duas sanções, uma penal e outra administrativa, pelo mesmo fato.

O quinto trabalho, “Um júri em Alvorada/RS”, é de autoria de Dani Rudnicki e Anna Carolina Meira Ramos. Os autores vêm acompanhando julgamentos em plenário do júri em Alvorada no Rio Grande do Sul com o objetivo de analisar qualitativamente os discursos de acusação e de defesa, sua pertinência com o caso ou com modelos estereotipados. A escolha de Alvorada se deu em razão do alto índice de homicídios para uma cidade do seu porte. O trabalho aborda especificamente os discursos de um julgamento no tribunal do júri ocorrido no dia 18 de maio de 2017, em que se identificou a utilização de argumentos moralistas absolutamente alheios ao fato imputado ao réu, tanto por parte da acusação quanto da defesa.

O sexto trabalho, de Antoine Youssef Kamel e Tiemi Saito, chamado “Uma proposta à reflexão da crise do paradigma carcerário”, é um trabalho com pretensão de refletir sobre a crise do sistema carcerário a partir do pensamento de Thomas Kuhn exposto na obra “A estrutura das revoluções científicas”. Os autores apontam uma disfunção entre o discurso oficial e as reais finalidades da pena de prisão, reconhecem que não há atualmente uma alternativa à prisão e indicam a experiência da APAC como um redutor efetivo de reincidência.

O sétimo trabalho, cujo tema é “Lei Maria da Penha”: uma análise atual da implementação da Rede Integral de Atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar sob a perspectiva da legislação simbólica”, é de autoria de Leandra Chaves Tiago e Luciana Andréa França Silva. O texto aborda que a Rede Integral de Atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar foi um dos mecanismos previstos legalmente para proteção da mulher diante da violência de gênero, sendo sua implementação o objeto do estudo das autoras, que trabalham uma importante crítica sobre a possibilidade de que a Lei Maria da Penha seja uma legislação penal simbólica no sentido negativo, uma vez que à falta de políticas públicas os mecanismos previstos é que podem efetivamente garantir a integridade das mulheres vítimas de violência.

O oitavo trabalho, de Natália Lucero Frias Tavares e Antonio Eduardo Ramires Santoro, cujo título é “Legitimação pela deturpação: a subversão do discurso feminista como justificativa para o encarceramento”, reflete sobre o imenso aumento do número de encarceramento de mulheres no Brasil, o que faz necessário um questionamento sobre as transcendências da pena. Isso porque os filhos recém-nascidos e até doze anos terminam por sofrer indireta ou diretamente os efeitos da pena. Os autores realizaram uma pesquisa empírica com base em questionário aplicado na cidade do Rio de Janeiro para conhecer a opinião e percepção da população sobre o aprisionamento de mulheres grávidas e obtiveram respostas que terminam por subverter o discurso feminista para legitimar o encarceramento. Foram também analisados dois casos concretos para avaliação da seletividade do encarceramento feminino.

O nono trabalho, “Justiça restaurativa no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania: da teoria à prática”, de Maria Angélica dos Santos Leal e Daniel Silva Achutti, apresenta as reflexões e indagações iniciais das atividades empíricas desenvolvidas junto ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) de Práticas Restaurativas de Porto Alegre. Um problema apontado é a dificuldade da academia pesquisar sobre algo que não se pode participar, uma vez que o acesso público se faz apenas nos casos de sucesso, o que influencia metodologicamente a atividade do investigador. Uma outra reflexão é que apenas os casos que não são graves é que são encaminhados ao CEJUS. São importantes reflexões a partir de pesquisa empírica.

No décimo trabalho, de Juan Pablo Moraes Morillas, o qual chamou ““Nova prevenção”, “policiamento comunitário” e “policiamento orientado à resolução de problemas”: uma reflexão em meio à crise no sistema de justiça criminal”, o autor questiona o caráter preventivo da pena e o baixo índice de elucidação de crimes como pontos centrais da crise do atual sistema de justiça criminal no Brasil. O autor parte daquilo que ele chamou de nova criminologia para contestar a eficiência do modelo tradicional de justiça penal e aponta a “nova prevenção” como uma alternativa de atuação do Estado antes do crime. O autor cita os programas “Ronda do Quarteirão” em Fortaleza - CE, e o “Ronda no Bairro” em Manaus – AM, como exemplos, e afirma que não se trata de uma nova roupagem para o mesmo discurso repressivo de sempre, mas leituras de conflitos sociais fora do direito penal.

No décimo primeiro trabalho de André Martins Pereira e Marcus Alan de Melo Gomes, intitulado “A fabricação dos medos pela mídia e a violência do sistema penal”, os autores questionam a relação entre a mídia e o sistema penal. Partindo da compreensão de Zaffaroni, os autores apontam que os meios de comunicação são agências do sistema penal, que produzem uma realidade específica. Trabalha-se com a ideia de que há mídia hegemônica e não hegemônica, focando o estudo nas primeiras, para então enfrentar a adesão subjetiva de trata Vera Malaguti Batista. Afirmam os autores que a demanda por punição, que leva ao encarceramento em massa, passa pela atividade dos meios de comunicação que provocam um desejo de encarceramento por conta da adesão subjetiva, que se mostra em tensão em relação à ineficiência deste encarceramento para o alcance dos supostos fins a que se destinam.

No décimo segundo trabalho, “A Criminologia da Libertação e o fenômeno da seleção policizante nas polícias brasileiras: uma epistemologia crítico-criminológica necessária”, a autora Vitória de Oliveira Monteiro pesquisou quais seriam as contribuições epistemológicas da Criminologia da Libertação para compreensão do fenômeno da seleção policizante, que implicam em práticas racistas e preconceituosas, que terminam por deteriorar a imagem e ética policial, o que é, como afirma a autora arrimada em Zaffaroni, próprio dos países latino-americanos. Para tanto a autora parte de uma abordagem da Criminologia da Libertação, à luz do pensamento de Lola Aniyar de Castro e Vera Andrade, como uma vertente criminológica latino americana que se pretende um processo emancipatório que alia a práxis e a teoria.

No décimo terceiro trabalho, “Realismo crítico, política criminal e dogmática: o papel ativo do discurso criminológico na inovação legislativa e doutrinária”, os autores Gabriel Antinolfi Divan e Eduardo Tedesco Castamann analisaram, diante de uma vertente crítica, o potencial crítico do discurso criminológico e sua influência prática. Partiram dos estudos de Gabriel Anitúa e aplicaram um realismo crítico de esquerda para terem uma influência prática maior, para implementar uma produção mais efetiva da criminologia, com o estabelecimento de um diálogo político que permitisse uma produção legislativa orientada politicamente.

No décimo quarto é último trabalho, de Francisco Antonio Nieri Mattosinho, intitulado “(Não) corra, que a polícia vem aí: análise das prisões em flagrante delito por tráfico de drogas submetidas às varas criminais de Ourinhos/SP a partir do REsp 1.574.681/RS”, o autor trabalhou para responder o problema sobre a legalidade da violação de domicílio por policiais coma apreensão de drogas sem mandado. Questiona-se a legalidade dessa apreensão no caso em que os policiais determinaram que o cidadão não corresse e, tendo ele não acatado a ordem, justificado o ingresso em domicílio e apreensão de drogas. O trabalho analisa o problema a partir da teoria do direito penal do inimigo de Günther Jakobs e analisa dados empíricos colhidos pelo autor nas audiências de custódia realizadas na Comarca de Ourinhos .

Professora Dra. Thayara Silva Castelo Branco – Uniceuma e UEMA

Professor Dr. Antonio Eduardo Ramires Santoro – UFRJ, UCP e IBMEC

Nota Técnica: Os artigos que não constam nestes Anais foram selecionados para publicação na Plataforma Index Law Journals, conforme previsto no artigo 7.3 do edital do evento. Equipe Editorial Index Law Journal - publicacao@conpedi.org.br.

ISBN:978-85-5505-534-8

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