XXIV Congresso Nacional Do CONPEDI - UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara
HISTÓRIA DO DIREITO I

História do Direito - Novos debates, novos olhares

Consolidando-se como um dos GTs mais tradicionais do CONPEDI, o GT de História do Direito proporcionou gratas supressas no CONPEDI de Belo Horizonte. Ao passo que a área vem se consolidando no Brasil, novos pesquisadores vem conseguindo participar de uma forma problatizante e crítica do debate.

Foram apresentados trabalhos que, de uma forma mais crítica ou mais tradicional, contribuíram para o debate no evento. Estes jovens pesquisadores revelam que as pesquisas na área - interdisciplinar entre história e direito - vem, cada vez mais, produzindo uma reflexão importante para que a prática jurídica possa valer-se de análises críticas sobre o social para consolidar o Direito como um instrumento transformador e formador da cidadania.

O artigo de Adriana Ferreira Serafim de Oliveira e Jorge Luis Mialhe, intitulado “HISTORIA DA EDUCAÇÃO JURÍDICA E A QUESTÃO DE GÊNERO: AS PRIMEIRAS BACHARÉIS EM DIREITO”, aborda a condição feminina no século XIX, procurando resgatar de forma pioneira, a história de vida daquelas que se tornaram bacharéis ainda na época do Império. Acompanhando a trajetória de duas bacharéis em direito, o trabalho propõe uma reflexão sobre a formação jurídica e a atuação profissional de duas mulheres diante de uma cultura jurídica predominantemente masculina.

O trabalho de Salete Maria da Silva e Sonia Jay Wright, intitulado “AS MULHERES E O NOVO CONSTITUCIONALISMO: UMA NARRATIVA FEMINISTA SOBRE A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA”, também aborda a problemática de gênero frente a uma cultura jurídica tradicionalmente moldada para o universo masculino. A partir de uma pesquisa nos Anais da Constituinte de 1988, o artigo traça uma crítica ao silêncio imposto pela historiografia à contribuição feminina no processo legislativo e a restauração da democracia brasileira, abordando, dentre outras coisas, a atuação do “Lobby do Baton” e sua repercussão na época.

Versando ainda sobre o mesmo tema, o trabalho de Maria Cecília Máximo Teodoro e Thais Campos Silva, intitulado “A HISTÓRIA DE EXCLUSÃO SOCIAL E CONDENAÇÀO MORAL DA PROSTITUIÇÃO”, procura traçar uma história dos estigmas e preconceitos em torno da prostituição ao longo da história, relacionando com a problemática atual sobre os pressupostos de uma sociedade democrática e peculiaridades do direito do trabalho.

Procurando traçar as origens do debate sobre autonomia Municipal e descentralização administrativa, Luciano Machado de Souza, com o artigo intitulado “VILLAS, CIDADES E MUNICÍPIOS: DESCENTRALIZAÇÃO E AUTONOMIA LOCAL COMO PERMANÊNCIAS DA COLONIZAÇÃO PORTUGUESA NA REPÚBLICA BRASILEIRA” realiza um resgate de nossa história do municipalismo, desde a época da Colônia, passando pelo Império até chegar a República e debate sobre a importância o tema para se compreender o vínculo com a cidadania nos tempos atuais.

A partir de um estudo comparativo entre Brasil e Portugal, Rogério Magnus Varela Gonçalves, no artigo intitulado “A LIBERDADE RELIGIOSA AO LONGO DA HISTÓRIA PORTUGUESA” discute sobre a relação entre a fé-católica e a política na organização do Estado brasileiro. Recuperando marcos significativos, como o preâmbulo e o artigo 5º da Constituição de 1824, o texto debate o tema de um estado laico e a presença de práticas religiosas na cultura nacional.

Vanessa Caroline Massuchetto apresenta o artigo intitulado “OS OUVIDORES E A CÂMARA MUNICIPAL DA VILA DE CURITIBA: UMA AMOSTRAGEM DA CIRCULARIDADE DA CULTURA JURÍDICA NA AMÉRICA PORTUGUESA (1721-1750)”, proporcionando um debate sobre a cultura jurídica Colonial e sobre a dinâmica e circularidade da administração portuguesa no âmbito administração local. O tema revela os embates e ajustes que a Metrópole precisava fazer para conseguir realizar seus objetivos nos recônditos da Colônia.

Existe um Constitucionalismo Latinoamericano? A partir deste questionamento, André Vitorino Alencar Brayner discute autonomia e dependência política no artigo intitulado “ELEMENTOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS (1822-1890) PARA UMA POSSÍVEL ORDEM JURÍDICA LATINOAMERICANA”. Abordando o debate entre Joaquim Nabuco e Oliveira Lima, por exemplo, o autor aponta elementos para se (re)pensar a existência de diferenças e semelhanças nos processos de construção de identidade dos países latino-americanos.

Fernanda Cristina Covolan, a partir da análise de fontes históricas sobre a escravidão no Brasil, realiza um estudo, intitulado “AÇÕES DE LIBERDADE NA CIDADE DE CAMPINAS (1871-1888)”. O trabalho revela particularidades do processo de abolição, trazendo a complexidade do tema e revelando, por exemplo, especificidades da dinâmica histórica ocorrida em Campinas, a quantidade de mulheres nos processos de alforria e outras situações que permitem reconstruir a História do Direito, no âmbito das relações jurídicas, sobre a abolição da escravidão.

Contribuindo para uma reconstrução histórica do Poder Judiciário no Brasil e, mais especificamente, do Supremo Tribunal Federal, Gustavo Castagna Machado, no artigo intitulado “‘NA INGLATERRA [...] AS SENTENÇAS TÊM A FORMA DE UM DISCURSO [...]. EM FRANÇA, PELO CONTRARIO, A LINGUAGEM JUDICIÁRIA [...] REVESTE UMA FORMA SILOGÍSTICA’: O DEBATE DE BARBOSA E BARRADAS”, procura recuperar e reposicionar, através do embate histórico entre Rui Barbosa e o Ministro do STF Barradas, quais foram as contribuições de Rui Barbosa para uma cultura jurídica brasileira no início da República e os elementos que propiciaram a construção de um “mito” em torno deste personagem de nossa história.

O minucioso artigo intitulado “O DESENVOLVIMENTO NORMATIVO DO DIREITO ELEITORAL NO PERÍODO IMPERIAL BRASILEIRO”, de autoria de Wagner Silveira Feloniuk, reconstrói o papel dos juízes brasileiros, na época do Império, com relação a organização e práticas do sistema eleitoral brasileiro. A partir da caracterização jurídica deste insipiente sistema eleitoral, o autor revela algumas das conexões com as estratégias políticas utilizadas com o intuito de fortalecer os interesses imperiais.

Numa abordagem sobre Teoria da História do Direito, Roland Hamilton Marquardt Neto, no artigo intitulado “A METODOLOGIA DA HISTÓRIA EM REINHART KOSELLECK: ANÁLISE E APLICAÇÃO À PESQUISA JURÍDICA”, reconstrói alguns dos principais temas da obra de Reinhart Koselleck e aponta para importantes temas da pesquisa em História do Direito como, por exemplo, a multiplicidade e dinâmica dos tempos históricos e a proposta da história do conceito.

Fábio Fidelis de Oliveira propõe, no artigo intitulado “HISTÓRIA DA SEGUNDA ESCOLÁSTICA PENINSULAR NO AMBIENTE UNIVERSITÁRIO LUSITANO: UMA REFLEXÃO SOBRE AS CONCEPÇÕES JURÍDICO-POLÍTICAS DO DOUTOR MARTÍN DE AZPILCUETA NAVARRO” a recuperação do debate sobre a 2ª fase do pensamento escolástico lusitano no contexto de um Império colonizador português. A partir da obra do Dr. Martin de Azpicuelta, o trabalho aborda o tema transposto para o contexto da tradição de Coimbra.

Realizando um resgate histórico de Tobias Barreto e da Escola de Recife, Everaldo Tadeu Quilici Gonzalez e Thiago Henrique de Oliveira Theodoro, no artigo intitulado “A FORMAÇÃO HISTÓRICA DO CULTURALISMO JURÍDICO E SUA IMPORTÂNCIA PARA O DIREITO BRASILEIRO”, relacionam pontos em comum do pensamento do culturalismo jurídico brasileiro, chegando até a proposta do filósofo do Direito Miguel Reale com a teoria da tridimensionalidade do Direito.

O artigo intitulado “O CONCEITO DE ORDEM NA DITADURA MILITAR BRASILEIRA”, de autoria de Robert Carlon de Carvalho e Mariel Muraro, traça uma história de algumas das principais características da Ditadura Militar, bem como de seus antecedentes, a partir da ótica do conceito de Ordem e como o tema prestou-se para justificar e legitimar diversas orientações políticas do governo.

Realizando um resgate histórico da trajetória das ideias de proteção aos Direitos Humanos, Gisele Laus da Silva Pereira Lima, no artigo intitulado “TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL: O RESGATE HISTÓRICO NA BUSCA PELA PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS”, propõe, a partir da análise de alguns crimes bárbaros cometidos na história, debater sobre a necessidade da existência desse tribunal e como o seu prestígio passou a ser questionado.

Analice Franco Gomes Parente e Marcus Vinícius Parente Rebouças, no artigo intitulado “ELEMENTOS FILOSÓFICOS E DOCUMENTAIS NA PROTO-HISTÓRIA DOS DIREITOS HUMANOS” contextualizam os antecedentes do surgimento de instituições de defesa dos Direitos Humanos, abordando temas como o paradigma teórico do jusnaturalismo, questões religiosas, marcos legislativos, fatos históricos, dentre outros eventos significativos sobre o assunto.

Como relacionar, cientificamente, pobreza e desigualdade com a presença dos latifúndios no Brasil? A partir desse questionamento, Hertha Urquiza Baracho e Iranice Gonçalves Muniz, no artigo intitulado “HISTÓRIA E FORMAS JURÍDICAS DE DISTRIBUIÇÃO DE TERRAS NO BRASIL”, reconstroem a história jurídica relacionada a ocupação e distribuição de terras no Brasil, procurando debater sobre a realidade atual do país e discutir sobre a função social da propriedade.

Nesse sentido, também abordando o tema da propriedade na história, Narciso Leandro Xavier Baez e Ana Paula Goldani Martinotto Reschke, no artigo intitulado “A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PROPRIEDADE ATÉ O ESTADO LIBERAL”, traçam aspectos relevantes da história da propriedade desde a antiguidade, passando pela Idade Média e Moderna, até a contemporaneidade, discutindo sobre suas especificidades e temas como a propriedade individual e coletiva e sobre os direitos atuais relacionados ao tema.

Lurizam Costa Viana, no artigo intitulado “LEGADO ROMANO À POSTERIDADE: A REVOLUÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO A PARTIR DA EDIÇÃO DO "CORPUS IURIS CIVILIS”, relata o contexto Imperial romano e recupera a história da compilação do Código Iuris Civilis, proposta pela Imperador Justiniano, e de sua recepção, como sendo, também, uma estratégia política para reunir novamente o Império Romano.

A partir da pesquisa sobre as práticas históricas para com os órfãos nas Casas de Misericórdia, Ana Carolina Figueiro Longo, no artigo intitulado “O RECONHECIMENTO DE CRIANÇA E ADOLESCENTE COMO SUJEITOS DE DIREITOS E A ATUAÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO AO LONGO DO TEMPO PARA EFETIVÁ-LOS”, resgata a história do Estado brasileiro e de como este passou a se preocupar em definir e controlar os “delitos” praticados por crianças e adolescentes e como esse programa se relacionou com políticas públicas específicas.

O artigo “A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E A RECUPERAÇÃO DE MENORES INFRATORES” de autoria de Álvaro Gonçalves Antunes Andreucci e Joao Gustavo Dantas Chiaradia Jacob, propõe um resgate histórico da legislação brasileira, no período da República, sobre menores infratores, com o intuito de debater as práticas de segregação ao menor realizadas pela nossa tradição jurídica e como este controle penal foi elaborado a partir de uma seletividade específica sobre qual grupo deveria ser apenado. Nesse sentido, o trabalho propõe também elementos para o debate atual sobre a maioridade penal.

A coletânea desses artigos do GT História do Direito certamente revelará ao leitor a expansão do campo da História do Direito no Brasil, voltada para a pesquisa histórica sobre o direito, as instituições jurídico-políticas e o pensamento jurídico-político brasileiras. O leitor poderá também acompanhar o amadurecimento desse campo da pesquisa nas faculdades e pós-graduações do país: cada vez mais o recurso à perspectiva histórica deixa de ser um olhar sobre o passado enquanto tal, para ser uma maneira de reconhecer, no presente, os vestígios das experiências passadas e o horizonte das experiências futuras. Num País de memória curta e muitas vezes impedida ou imposta, esse é um passo bastante significativo na evolução do direito e da democracia.

Uma boa leitura a todos!

ISBN:978-85-5505-129-6

Trabalhos publicados neste livro: